Faustino Antunes

sexta-feira, 16 de julho de 2010

RIBEIRÃO MARIALVA


O RIO DA MINHA INFÂNCIA



Na minha infância havia um rio. Para mim, era um grande rio, que só poderia ser atravessado por cima de pinguelas ou com muito cuidado pulando de pedra em pedra. Era chamado de córrego, mas nós crianças o chamávamos de “córgo”. E era nas margens desse córrego que extraiamos o barro azulado, que mais tarde fiquei sabendo que se chamava argila, para nos divertir fabricando bonecos e bolinhas que serviriam de munição para os estilingues. Esse barro era transportado em folhas de chapéu de couro, planta muito conhecida pelas suas propriedades medicinais e amassado nas mãos até tomar a forma desejada. Nas margens, colhíamos também os frutos de uma árvore conhecida na região como “salta martin”, que pareciam ser feitos de látex e eram muito bons para brincar. Peixes também havia alguns: lambaris, piabas, bagres, cascudos e os pequeninos guarus. Nas pescarias, as iscas eram as infalíveis massas de pão ou minhocas, mas geralmente pescávamos com as peneiras de abanar café. Era indescritível a sensação de ver os peixinhos pulando desesperados, querendo voltar pra água, mas iam mesmo para o embornal. Nunca me esquecerei do susto que levamos quando pescamos um cágado esperneando, que voltou pra água com peneira e tudo.
Nem só para as crianças se divertirem serviam as pinguelas. Quando havia terço do outro lado do rio, os adultos também se serviam delas, com as mulheres encarrapitadas, gritando de medo. Se era noite, os lampiões a querosene alumiavam o trajeto precariamente com as raízes no chão arrancando unhas e lascas dos pés dos passantes.
Hoje o meu rio ainda existe. Não posso dizer que esteja vivo, pois o fiozinho de água que escorre não comprova isso. Escorre por entre um mar de sacolas plásticas, garrafas Pet e outras tranqueiras produzidas pela modernidade. A fauna aquática praticamente desapareceu e somente algum guaru teimoso ainda resiste bravamente na água poluída. Um grande amigo de infância nos estertores da morte, mas que teima em continuar vivendo. Um bravo guerreiro que não entrega os pontos, mas até quando? Até quando a nossa irresponsabilidade vai continuar a ceifar vidas?
Infelizmente é só mais um, dos tantos sendo mortos em nosso planeta.

2 comentários:

  1. Gostei da narração. Estava procurando algum comentário da bolinha chamada salta martin que a gente batia no chão e ela pulava. Morei em um lugarejo no interior do estado de São Paulo que tinha um corguinho também. Abs

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  2. Gostei da narração. Estava procurando algum comentário da bolinha chamada salta martin que a gente batia no chão e ela pulava. Morei em um lugarejo no interior do estado de São Paulo que tinha um corguinho também. Abs

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