Faustino Antunes

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010


CHEIROS DE ANTIGAMENTE


É interessante perceber que nas nossas lembranças, conseguimos sentir os cheiros como se fossem atuais, como se os estivéssemos sentindo agora. Não sou saudosista como pareço, mas como sei que sou o resultado de uma construção de coisas passadas, as vezes pego-me a rememorar fatos que estão perdidos nos arquivos do que se foi. E esses fatos geralmente vem acompanhados dos seus respectivos cheiros.
Nas tardes modorrentas quando a janta começava a ser preparada, o cheiro ardido da lenha no fogão era de lei. Uma vez por semana o forno de barro exalava um misto de cheiro de pão quentinho, misturado com o do amendoim que era torrado junto para aproveitar o calor. As floradas das laranjeiras eram um prelúdio de que a primavera estava chegando. As flores do café perfumavam o ar intensamente num misto de nostalgia e paixão. O cheiro de terra molhada era carregado de frescor e me fazia particularmente feliz pelo amor que sentia e sinto até hoje pela chuva que restaura o solo e as plantas.
Alguns outros cheiros não eram tão constantes, mas também deixaram marcas na lembrança. E assim como o cheiro do milho embonecando, com seus pendões agitados pelo vento. O cheiro do arroz maduro quase em ponto de colheita, com melancias plantadas pelo meio. Melão maduro no meio do cafezal exalava um delicioso perfume de fruta gostosa e pelo cheiro se encontrava o fruto, de preferência antes dos passarinhos. Na colheita do arroz, a palha ao secar perfumava todo o ambiente com seu cheiro doce. O do sabão no taxo era bem diferente do da rapadura e do torresmo, mas todos estão gravados na lembrança. Quando cachos de bananas amadureciam perdidos no bananal, não era difícil encontrá-los, pelo odor característico que exalavam. Se algum cacho de uva amadurecia antes dos outros, qualquer pessoa que passasse por perto o saberia. O cheiro da erva-doce nos pães de Natal vai estar presente em todos os natais do mundo, assim como o do doce de figo e de pêssego. O café secando no terreiro exalava um cheiro adocicado e gostoso, mas que em nada lembrava o delicioso cheiro do café sendo coado.
E assim era! E muitas outras flagrâncias que se perderam no tempo, mas que de repente voltam com força, fazendo lembrar que nem só de imagens são feitas as nossas lembranças! Somos seres sentimentais e nossa memória está presente em cada célula do nosso corpo!

Nenhum comentário:

Postar um comentário